Celebrado em 19 de novembro, o Dia Mundial do Banheiro é promovido globalmente pela UN-Water, mecanismo interagências das Nações Unidas que coordena os esforços nas questões de saneamento. Esta celebração, assim como o Dia Mundial da Água, são ações de conscientização global promovidas pela ONU para chamar a atenção para pontos fundamentais de uma agenda de sustentabilidade e direitos humanos.
O acesso universal à água e ao esgotamento sanitário constitui o ODS 6 (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) de um total de 17 objetivos, em compromisso ratificado por todos os países-membros das Nações Unidas em 2015. Na época, foi estabelecido o ano de 2030 como prazo para o cumprimento desses objetivos.
No Brasil, o Instituto Brasileiro de Água e Saneamento (IAS) promove o Dia Mundial do Banheiro desde 2020. A missão é somar esforços para garantir a universalização do saneamento no Brasil, especialmente para ampliação do acesso ao esgotamento sanitário. Em 2023, faltando apenas sete anos para se chegar às duas metas, o que se vê são indicadores muito aquém do atendimento para todos. Isso vale principalmente para o Brasil. Como bem ressaltou a presidente do CEBDS, Marina Grossi ao declarar:
Precisamos de um trabalho conjunto entre governos, empresas e sociedade civil para lidar com esse problema e garantir a universalização do saneamento, para finalmente mudar esta realidade que nos envergonha em pleno século 21.
Coincidência, ou não, neste mês de novembro o Instituto Trata Brasil, organização da sociedade civil que busca a universalização do saneamento básico no país, lança a primeira edição do estudo
“A vida sem saneamento: para quem falta e onde mora essa população?”,
produzido em parceria com a EX ANTE Consultoria Econômica e o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).
O estudo traça o perfil socioeconômico e demográfico da população brasileira que sofre com privações nos serviços de saneamento básico, utilizando dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Continuada Anual (PNADCA), produzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2013 e 2022.
A pesquisa considera cinco categorias de privações:
- Privação de acesso à rede geral de água;
- Frequência de recebimento insuficiente de água potável;
- Disponibilidade de reservatório (caixa d’água);
- Privação de banheiro; e
- Privação de coleta de esgoto.
Os números são alarmantes: considerando as moradias brasileiras, da totalidade de 74 milhões, quase 9 milhões não possuem acesso à rede geral de água; quase 17 milhões contam com uma frequência insuficiente de recebimento; cerca de 11 milhões não possuem reservatório de água; cerca de 1 milhão não possuem banheiro; e 22 milhões não contam com coleta de esgoto.
O estudo indica que cerca de uma em cada duas moradias brasileiras convive diariamente com algum tipo de privação no saneamento.
As estatísticas da PNADCA apontam que 8,9 milhões de moradias não estavam ligadas à rede geral de abastecimento de água tratada em 2022, o que correspondeu a 12% do total de residências no país, afetando 27,270 milhões de pessoas. A maior parte delas (35%) estava localizada nos Estados do Nordeste brasileiro, totalizando 3,117 milhões de residências em 2022. Na região, a maior concentração de moradias com essa privação estava na Bahia, em Pernambuco e no Maranhão. No Nordeste, cerca de 17 a cada 100 moradias ainda não estava ligada à rede geral de abastecimento de água tratada. Em três estados, contudo, essa proporção estava bem próxima ou passava a marca de 20 a cada 100, como foi o caso da Paraíba, de Alagoas e de Pernambuco.
Já os cinco melhores Estados, que apresentam o menor índice percentual desta privação, estão espalhados pela região Sudeste, Centro-Oeste e Sul do país: São Paulo, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Paraná e Rio Grande do Sul.
Já no que se refere à ausência de banheiro as estatísticas da PNADC indicam que 1,3 milhão de moradias não tinham banheiro de uso exclusivo do domicílio em 2022. Esse número correspondeu a 1,8% do total de residências no país. A maior parte das moradias com privação de banheiro (63,1%) estava localizada no Nordeste brasileiro, totalizando 841 mil habitações em 2022. Entre os Estados do Nordeste, a maior concentração de moradias com essa privação estava no Maranhão, Bahia e Piaui. Na região Nordeste, cerca de 4 a cada 100 moradias ainda não tinham banheiro de uso exclusivo.
Mais sério ainda é se constatar que 22,832 milhões de moradias não tinham acesso à rede geral de coleta de esgoto em 2022.
Esse número correspondeu a 30,8% do total de residências no país.
O estudo indica que 42,7% das residências com privação de acesso à coleta de esgoto estavam no Nordeste, totalizando 9,750 milhões de moradias. Entre os Estados da região, a maior concentração de moradias com essa privação estava no Maranhão, Piauí e Rio Grande do Norte. No Nordeste, metade das moradias ainda não tinha acesso à coleta de esgoto. Os Estados com os melhores índices foram São Paulo, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo, com predominância da região Sudeste do país.
IMPLICAÇÕES PARA A SAÚDE
A falta de água tratada e carência de serviços de coleta e de tratamento de esgoto tem um impacto direto sobre a saúde da população, principalmente nos jovens e nos idosos, pois eleva a incidência de infecções gastrointestinais e doenças respiratórias, dado que a higiene das mãos é uma forma muito eficaz de reduzir a probabilidade de transmissão dessas enfermidades.
Gráfico 12 – Evolução da parcela da população com acesso à rede de distribuição de água tratada e da taxa de incidência de internações por doenças respiratórias, Brasil.
Além dos impactos para o bem-estar da população, a falta de saneamento básico, ao aumentar a incidência de infecções, provoca o afastamento das pessoas de suas funções laborais, acarretando custos para a sociedade com horas não trabalhadas, além de incorrer em despesas públicas e privadas com o tratamento dessas pessoas infectadas.
Como se pode ver no gráfico ao lado, a incidência de doenças de veiculação hídrica cai na medida que aumenta a população com acesso à rede coletora de esgoto.
CONCLUSÃO
De acordo com Marina Grossi, presidente do CEBEDS, “o cenário do saneamento básico no Brasil é de uma discrepância inaceitável. A baixa cobertura de saneamento atual reflete impactos negativos em áreas vitais para qualquer sociedade, como saúde, educação, produtividade, geração de renda e qualidade ambiental. Ou seja, interfere de forma direta e concreta nas três principais dimensões da sustentabilidade – econômica, social e ambiental.
Luana Pretto, presidente-executiva do Instituto Trata Brasil, afirma que ”A vida sem saneamento: para quem falta e onde mora essa população?” aponta como a desigualdade social brasileira é refletida no acesso ao saneamento básico.
“O estudo mostra os grandes desafios que ainda temos para universalizar essas modalidades de infraestrutura no país. O problema afeta de maneira contundente as jovens famílias brasileiras, muitas das quais vivendo abaixo da linha da pobreza, que além de tudo adoece mais graças a essa falta de infraestrutura Quase a metade do país viver com ao menos uma privação de saneamento básico é algo inaceitável e que gera um imenso impacto negativo para todos, afetando a saúde, educação e qualidade de vida de milhões de brasileiros”, finaliza a executiva.